A Mão Esquerda da Escuridão – Ursula K Le Guin
Tradução: Susana L. de Alexandria – Editora: Aleph
Ano de Lançamento: 1969 – Minha Edição: 2019 – 304 páginas
E se descobríssemos um planeta onde as pessoas não têm sexo, ou melhor, têm os dois, ou ainda melhor, podem ter os dois? É essa a premissa da obra mais famosa de Ursula Le Guin escrita no final dos anos 60.
Apesar dessa apresentação, a temática sexual e os dramas dela decorridos são muito sutis em toda a estória, que na realidade é uma trama política muito interessante. Em um mundo que vive em permanente inverno, um visitante, que é representante de uma confederação de planetas, da qual a Terra faz parte, deseja convencer este novo mundo a se tornar mais um associado.
Considerada a primeira obra do gênero Ficção Científica feminista é bem tímida nestes aspectos, o que foi alvo de críticas das ativistas no período pois a trama sexual é só mais um dos aspectos daquele mundo inédito que ela criou com tantos detalhes e esmero – há até um apêndice até esmiuçando o calendário e o fuso horário daquele planeta. Esse “worldbuilding” é sempre um dos melhores aspectos da obra de Le Guin.
Na maioria das vezes, Gethen parece ser um mundo habitado apenas por homens que, de vez em quando, se tornam mulheres, mas isso é mais culpa da mente do leitor e também do idioma, pois o uso dos pronomes e concordância é masculino (inclusive no original em inglês). Mas, dada a data da publicação, é injusto com a autora cobrar mais ousadia na sexualidade – o que ela fez na época já foi considerado algo muito pioneiro.
Mais claras são as alegorias à União Soviética, por outro lado. A trama é mais atrelada às questões políticas: o planeta que alvo dessa Confederação Interplanetária é povoado por vários países diferentes, e o protagonista precisa de uma adesão unânime dessas nações para que não haja favorecimento de um ou outro ente. Dos principais, um se organiza de forma mais ou menos feudal, e o outro, ainda que não seja socialista, é mais próximo a um Estado Moderno com algumas representações de órgãos de repressão, que, pelo ano de lançamento, no auge da Guerra Fria, provavelmente a autora tinha em mente essas instituições soviéticas.
Claro que todos os eventos políticos se passam com o visitante na companhia de alguns personagens especiais e a intimidade que ele desenvolve com esses habitantes nativos é o espaço para explorar a questão da sexualidade. Todavia, quando são feitas relações entre a sexualidade e o desenvolvimento social daquela civilização, que gira em torno de uma sociedade tensa mas que raramente se envolve em conflitos armados, não me foi convincente o suficiente.
Excelente (5/5)
Uma das obras mais clássicas, em todos os sentidos, da ficção científica. uma trama política leve mas instigante, de leitura é muito agradável.
Antropologia: o pai de Ursula foi um dos pioneiros da antropologia nos Estados Unidos, no início do século XX, e estudou vários povos originários na América. A autora diz que muito de seu estilo é influência paterna, e neste livro é bem sentida. O livro se constrói a partir de observações do visitante alienígena sobre aquela civilização e alguns “documentos” dos habitantes do planeta, inclusive mitos e religiões. A observação e comentários lembram bastante o trabalho dos antropólogos.
Últimos Posts
Apontamentos sobre a teoria do autoritarismo
Neste livro, originalmente um curso de graduação, Florestan Fernandes demonstra como a democracia burguesa já carrega todos os elementos do autoritarismo.
Condição Artificial
Livre de todas suas amarras, o robôssassino vai atrás de entender seu passado. A novidade agora é sua interação com outros robôs e androides.
Lênin: uma introdução
Faz um esforço enorme de condensar vida e obra de Lênin em um livro de bolso; mas, ainda que seja uma boa introdução, oscila muito entre uma abordagem e outra, entre sua produção textual e eventos que ele participara.