Espere agora pelo ano passado


Espere agora pelo ano passado – Philip K. Dick

Tradução: Bráulio Tavares – Editora Suma (Cia das Letras)

Data de Lançamento: 1963 – Minha Edição: 2018 – 293 páginas


O que há de mais fascinante na Ficção Científica e o porquê desse gênero ser atemporal, mesmo tratando com freqüência de tecnologia e futuro, são seus conceitos. E são esses que separam os grandes autores dos demais; claro que Philip Dick não precisa ser apresentado, mas mais uma vez o que torna a obra fenomenal é seu conceito.

A Terra se envolveu em uma guerra intergalática! De novo. “Até aí, tudo bem“.

A genialidade do autor chega (um pouco atrasada, é verdade, pois o livro demora muito a engrenar) quando no meio desse conflito contra outros planetas é apresentada uma arma química a ser utilizada: uma droga alucinógena que faz o usuário viajar no tempo.

Sequer vemos a guerra, ela é um plano de fundo para a trama política que nosso planeta foi arrastado. Ao descobrir a vida extraterrestre, fomos agraciados com a “parceria” de uma nação “amiga”, um grande Império multiplanetário, muito mais avançado, que, para não nos invadir, nos obriga a entrar em uma guerra ao seu lado.

O problema é que até chegarmos nesse cenário demora mais de 60 páginas, que são dedicadas à convivência conturbada do protagonista com sua esposa, e também a uma reflexão sobre a relação da humanidade com o passado. Apesar deste último me atrair como tema, é completamente dispensável, parece que vai fazer algum sentido, afinal o tema do livro é viagem no tempo, mas é esquecido ao longo da estória, e, pior, confunde bastante a leitura nos capítulos iniciais.

Gino Molinari, secretário geral das Nações Unidas, e líder da humanidade nessa guerra é o personagem que muda completamente o rumo do texto, e não apenas na trama política. Sua personalidade também dá sentido aos dramas pessoais do protagonista em conversas bem íntimas e incisivas. Sua engenhosidade em todas suas ações já me faz tê-lo como um dos maiores personagens da Ficção Científica.

A partir desse ponto também somos introduzidos ao uso dessa droga que permite, involuntariamente, a viagem no tempo. Há problemas de funcionamento interno desse conceito criado por Dick, em alguns momentos as regras que ele cria parecem ser desobedecidas, o que torna a leitura um pouco desorientada. Parece que perdemos alguma coisa. Entretanto, no geral, quando as implicações da droga aparecem na trama da guerra é a hora que o livro brilha e torna a experiência muito recompensadora.

Muito Bom (4/5)

Demora muito a engrenar, usando espaço para tópicos que são abandonados posteriormente, e dentro de seu conceito, muito interessante, há algumas contradições que desorientam um pouco. Mesmo assim, vencendo as primeiras 60 páginas, se torna um livro fantástico na relação entre a droga e o jogo político.

Dramas pessoais: algumas das temáticas que o protagonista enfrenta são, na realidade, muito próximas da própria vida do autor. Ele foi casado por 5 vezes mesmo vivendo apenas até os 53 anos. Na altura da escrita desta obra, estava em seu terceiro matrimônio, no qual ele teve seu primeiro filho. Muito do arco do personagem principal é se decidir ou não pelo divórcio. Será que a esposa dele à época pegou a indireta?

Edição Pelada: apesar do luxo da capa dura e da qualidade do material, esta edição, que é de um selo da Companhia das Letras, não tem nenhum elemento pré ou pós-textual.


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Publicado por Lucas Palma

Paulistano, desde que me lembro por gente fascinado pelas possibilidades do futuro, em games, filmes e seriados, herança paterna e materna. Para surpresa geral, ao final da juventude descobri fascínio também justamente pelo oposto, me graduando e mestrando em História, pela Universidade Federal de São Paulo. Sou autor de Palavras de Revolução e Guerra: Discursos da Imprensa Paulista em 1932.

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