Jornada nas Estrelas: Enterprise (3ª Temporada)

Jornada nas Estrelas: Enterprise – Terceira Temporada


Finalmente! Finalmente Enterprise encontrou sua identidade e um ritmo narrativo próprio; e essa direção resultou numa melhora geral da série e atingindo uma qualidade muito maior que a maioria dos anos das suas irmãs da franquia.

Desde a seqüência final de DS9, uma interminável discussão sobre as possibilidades e necessidades de “serialização” de Jornada nas Estrelas começou a pipocar. A narrativa episódica, de estórias que iniciam e encerram num mesmo capítulo, era a adotada desde 1966, reforçada em 1987 e era a dominante na TV nos anos 90; e parecia casar perfeitamente com “as jornadas nas estrelas”. Exploração de novos planetas e civilizações.

Mas gradualmente, especialmente na Ficção Científica, os seriados foram adotando arcos principais que davam um certo sentindo ao seriado e criando uma estória geral para aquele universo: Arquivo X, Stargate SG1 ou Buffy – A Caça Vampiros, já adotavam esse formato. Jornada nas Estrelas demorou muito a adotar algo assim, TNG passou sem nada do tipo e DS9 da metade para o final. VOY foi concebida já com um grande objetivo final. Era uma transformação da audiência e da linguagem da época.

Episódio 23: Contagem Regressiva

Na sua primeira temporada, ENT tentou emular esse formato, dando uma grande direção geral da série em explicar a gênese dos conceitos de Jornada nas Estrelas. Como nasceu a Frota, como nasceram as rotinas das naves espaciais, como foi o primeiro contato com os Klingon, como conheceram os Andorianos, como conceberam a primeira diretriz e assim por diante. Não deu certo. Ao meu ver não por isso, mas por uma baixa qualidade de alguns capítulos decisivos, todavia, essa foi a recepção dos fãs – diziam ser desnecessário explorar isso.

Dessa forma, na segunda temporada, ENT ao retirar esse argumento geral do pano de fundo dos episódios, ficou completamente sem direção. Mas, em especial, ficou sem identidade, já que a proposta da série, em sua essência, era justamente essa. Foi tudo pior ainda.

Numa curiosa coincidência, assim como foi com TNG e DS9, apenas a partir da terceira temporada que o seriado engrenou – pena que já era tarde demais.

Agradou: serialização na medida perfeita

Enterprise conseguiu se achar ao encontrar também uma medida perfeita da serialização em Jornada nas Estrelas. A narrativa episódica é a alma do trekker, é que gera a exploração e a descoberta. Acredito que muito da birra com DIS e PIC tenha a ver com isso – e dou certa razão. Os capítulos de Discovery se misturam um pouco na memória, não conseguimos lembrar exatamente qual acontece o quê.

Da mesma forma, uma Ficção Científica muito serializada perde muito potencial. O espaço para explorar conceitos diversificados é muito menor: dificilmente seria possível abordar viagem no tempo, alegorias à AIDS, intervenção tecnológica em uma civilização menos avançada ou questões de gêneros em uma mesma temporada de uma série como essas. Como em Battlestar Gallactica, por exemplo, o foco é em questões sociais, religião e política; ou The Expanse, já mais direcionada à política e à economia.

Episódio 9: Estrela Polar

Aqui, na terceira temporada, os produtores conseguiram conceber um grande arco único da temporada, e ao mesmo tempo encaixar na busca por esse objetivo principal, episódios conectados minimamente ao subplot e, ao mesmo tempo, únicos por si só. Como Extinção, Impulso ou Estrela Polar.

E, ainda, tiveram um excelente planejamento de como esse arco central seria abordado. Os capítulos, algumas vezes muito mais, outras muito menos, sempre estavam caminhando para o objetivo – encontrar a Arma Xindi – mas todos conseguiam fazer um sentido na narrativa geral do enredo. Alguns outros capítulos a princípio mais desconectados, traziam alguma informação importante sobre o pano de fundo, como a interpretação religiosa das esferas, apresentadas em Reino Escolhido.

Tudo foi caminhando muito bem. Por exemplo, após Anomalia, um capítulo mais conectado com a viagem pela Expansão, e com um desfecho sombrio de Archer ultrapassando algumas linhas morais; tivemos Extinção, uma história completamente solta em essência, e com um final onde o mesmo capitão recupera sua bússola moral, vivendo para a alma da (futura) Federação.

Episódio 19: Relatório de Danos

Claro que nada teria dado certo se os episódios diretamente ligados a busca pela Super Arma Xindi não fossem todos maravilhosos; o que não faltou foram tensões e batalhas. E planejamento até mesmo nas rimas narrativas; situações que a Enterprise passou no começo da temporada, são reencontradas ao final, mas em outra perspectiva. Gostaria muito que esse formato encontrado tão perfeitamente por ENT fosse revisitado por séries futuras.

Não agradou: desenvolvimento das relações interpessoais dos personagens – e mudança na abertura.

Sem dúvida o ponto fraco mais constante de Enterprise é o desenvolvimento dos personagens secundários. Com exceção da tríade principal, todos os demais são muito mal tratados. E, numa temporada de franca evolução da série, como esta aqui, isso se tornou ainda mais latente, pois ficou muito para trás em relação aos demais elementos narrativos.

Quando constatamos que o relacionamento entre Trip e T’Pol foi a única coisa que caminhou nesse sentido na série, sabemos que ENT está muito mal na fita.

Episódio 01: Os Xindi

A história da neuropressão vulcana, se serviu para, pelo menos, decidir qual seria o interesse amoroso da imediata da nave, de resto foi vergonhosa. Todas as alegorias sexuais, como a mais óbvia de serem sessões de massagens, ou tais as frases de duplo sentido – “pressione mais forte (harder, no original)” – e, ainda, a estrutura de “posturas” no lugar de “posições“. Isso, aliás, teve ter ficado tão ridículo entre os próprios roteiristas, que eles incluem uma personagem trocando as duas palavras em um capítulo, já da metade para o final.

Aliás, aquele episódio, Percursor, escancara completamente o quão mal tudo foi desenvolvido. A relação entre os MACOs e a tripulação, que deveria discutir a militarização da missão da Enterprise e todo o dilema ético envolvido – que marginalmente são tocados ao longo do ano – não usa nenhum desses temas, vai para o caminho da comédia e o resultado é terrível. Por um lado, temos um triângulo amoroso entre T’Pol, Trip e uma personagem que jamais aparecerá novamente, por outro, dois oficiais passam o capítulo todo brigando (nas vias de fato) para ver quem é o humano mais macho do espaço sideral.

Episódio 15: Percursor

Ao invés de Reed e Hayes simbolizarem uma disputa entre controle civil e militar, a disputa entre a exploração e o conflito… na realidade, os dois são pelo conflito. Só querem saber quem manda em quem. Patético. E assim vai. Tal como este talvez tenha sido o episódio de maior atenção para Reed, os capítulos dedicados especialmente Hoshi e Phlox também são péssimos, são os dois piores da temporada. Hayes, aliás, não sei exatamente o contrato que fizeram com o ator, mas parece que escolheram mal os capítulos os quais o escalar, alguns decisivos com presença dos MACO ele não aparece. Mayweather, então, tem sorte se lembrarem seu nome. Nenhum deles ganha um traço novo um evento marcante por todo o tempo na Expansão.

POR QUE MEXER NA ABETURA? A emenda saiu pior que o soneto, a música exatamente a mesma, mas uma batidinha completamente aleatória entrou junto – parece quando você montava no Yoshi numa fase de Super Mario World. E ficou completamente fora do clima da temporada, mais sombrio. As vezes víamos um teaser realmente mais dark, e aí na abertura um ritmo “alegre” quebrava o tom, conseguiram piorar algo que já era mal aceito pelos fãs.

Dos vilões, apenas Degra ganha maiores contornos, e ficando muito fácil optar por colocaras espécies menos humanas no campo oposto durante as disputas finais. E o desenvolvimento dos Xindi apenas tem como direção ressaltar a ameaça representada pelos repitilianos. Aliás, eu gostei muito do que foi apresentado como lore dessas espécies, queria muito que explorassem melhor.

Um último ponto fraco, é que ao final da temporada, provavelmente por restrições de orçamentos, a reutilização de sets e props (objetos de cena) começa a ficar muito nítida. É fácil reconhecer que a mesma nave aparece mais de uma vez, ou que tais objetos que era um gerador de alguma coisa se tornam um injetor de outra.


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Publicado por Lucas Palma

Paulistano, desde que me lembro por gente fascinado pelas possibilidades do futuro, em games, filmes e seriados, herança paterna e materna. Para surpresa geral, ao final da juventude descobri fascínio também justamente pelo oposto, me graduando e mestrando em História, pela Universidade Federal de São Paulo. Sou autor de Palavras de Revolução e Guerra: Discursos da Imprensa Paulista em 1932.

4 comentários em “Jornada nas Estrelas: Enterprise (3ª Temporada)

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