Jornada nas Estrelas: TOS – 1ª Temporada (melhor, pior e essencial)

Jornada as Estrelas: A Série Original


O que é curioso da primeira temporada de TOS, e que revela a passagem do tempo do seriado, ainda que a franquia esteja viva, é como os episódios menos interessantes estão muito mais concentrados no início da temporada; digo isso levando em conta a ordem de exibição – que foi até alterada de propósito para ter primeiro capítulos com maior probabilidade de sucesso de audiência.

(Desculpem martelar nisso, rapaziada; historiador é fissurado por perceber a passagem do tempo das coisas é exatamente nosso trabalho – isso não quer dizer mais ou dizer menos sobre aquilo.)

Com a exceção do segundo piloto, que acho bastante inferior À Jaula, o primeiro capítulo com um argumento realmente mais complexo e filosófico de TOS é E as meninas, de que são feitas?, apenas o 7º a ser exibido; os anteriores foram bem menos ambiciosos. E os seguintes também: ao meu ver a série só engrena com a qualidade que lembramos a partir de O Ardil Carbonite – que deveria ter sido o segundo exibido – e de A Coleção.

Os primeiros episódios são justamente onde se sente mais nitidamente o sexismo; a pobre Janice Rand que o diga. Mas as próprias tramas eram simplórias, com ares cômicos, ou contornos mais individuais – não raras são as as tramas que são resolvidas pura e simplesmente porque uma antagonista mulher se apaixona por Kirk, como em Miri.

Nada disso foi a toa; ainda temerários com o destino do seriado, os executivos e produtores decidiram colocar a frente os capítulos que teriam mais chances de serem bem aceitos pelos expectadores americanos dos anos 60 – consequentemente, os mais “retrógrados”, ainda que não seja exatamente o melhor termo para esse comentário, pois falo meio século depois.

Melhor Epiódio

A Coleção – Esta é uma história única em vários os sentidos, é o único roteiro de duas partes da Série Original (consequentemente os únicos que são continuação direta um do outro) da mesma forma que é um raríssimo exemplar da televisão em que um piloto cancelado é reaproveitado e inserido na série final – mas de uma maneira maravilhosa e também única.

Esta decisão, ao incorporar Pike e uma vida anterior da Enterprise à série, aprofundou o lore de Star Trek em níveis inimagináveis; eu, quando criança descobri que a nave tinha outro comandante antes do Kirk, fiquei boquiaberto. Tanto é que ele a número um continuam sendo explorados até hoje, quase sessenta anos depois. E mesmo se descontarmos essa questão, temos um episódio excelente, cerebral em todos em sentido; em roteiro e argumento. O elogio deve ser repetido ao próprio A Jaula, também.

Inteligentes e tocantes também são os enredos de A Cidade a Beira da Eternidade, considerado “o” melhor toda a franquia e talvez do gênero, ainda que não seja meu favorito; Um gosto de Armageddon também me agrada demais com todas as alegorias às guerras modernas e a forma como a sociedade contemporânea interage com elas; e, ainda, o Demônio da Escuridão, um capítulo rendondinho e bonitinho do começo ao fim, seria o Casablanca da Série Clássica.

Não menos inteligentes, mas que adquirem ainda mais relevância por se tratarem de verdadeiros pequels de histórias, personagens ou civilizações inteiras, são O Equilíbrio do Terror, que nos apresenta os Romulanos e transforma a Enterprise em um submarino; e A Semente do Espaço que introduz o maior vilão de toda Star Trek; Khan, através de um premissa pra lá de intrigante; a de ter a chance de conhecer “napoleões” do passado.

Gostariam que fossem melhores: 1) Arena – melhores coreografias, levando em conta a falta de mobilidade da fantasia, levantariam muito o episódio. 2) A Hora Rubra – se fossem dois capítulos separados, desenvolvendo cada um dos argumentos, seriam dois icônicos. 3) O Fator Alternativo – Mesmo sendo um verdadeiro ataque epilético em forma de roteiro, ainda acho que dava para sair algo bom daqui. 4) Operação: Aniquilar! – queria ter entendido mais sobre as amebas, parasitas, sei lá o fossem, para dar um sentido ao colapso das civilizações.

Pior Episódio

As Mulheres de Mudd – Algumas coisas se tornam memoráveis apenas pelo fato de serem repetidas várias vezes. Pode até ser que este capítulo tenha feito sucesso nos anos 60, e o fez, de fato; mas é um dos mais, senão o mais datado de todas as séries. Entretanto, mesmo se excluirmos as diferenças geracionais da equação, este episódio é uma idiotice sem tamanho.

Basta apontarmos que a tecnologia futurista aqui eram pílulas de beleza e o grande conceito filosófico seria discutir o que é uma mulher para casar ou o que seria para ser divertir. Com relação também à tecnologia, há um debate sobre arear panelas. E, apesar de um roteiro mais amarradinho, o final, com as pílulas placebo não fez o menor sentido.

A única razão para este episódio ser tratado como clássico, é o fato de Mudd ser um raríssimo personagem recorrente da TOS (eu mesmo já o conhecia mesmo antes de assistir seus capítulos), porque é ridículo do primeiro ao último segundo além de péssimo gosto.

E de muito mau gosto também é Inimigo Interior. Aliás, a personagem da Ordenança Rand neste começo do seriado parece ter o único propósito de ser assediada pelos homens da nave; de olhares e comentários, a até passada de mão. Neste aqui ela sofre uma tentativa de estupro da parte má de Kirk, e ainda ao final, um diálogo faz ela admitir que ele, o Kirk mau, tinha seu valor de macho. Bizarro.

E, aliás, você sabia que o Dr. McCoy está morto e a imensa maioria dos episódios e filmes de Jornada nas Estrelas retratam um robô que tem a sua forma? É o que eu entendi ao assistir A Licença, um episódio sem pé nem cabeça que passou por 3 roteiristas diferentes, cada um conseguindo piorar um pouco.

Já da metade para o final, temos Amanhã é Ontem, que tem seu atrativo de ser uma interessante história de viagem “acidental” no tempo, mas que acaba se enrolando ao resolver os próprios problemas levantados. E o famigerado Fator Alternativo, em que os próprios personagens literalmente desistem de explicar o que estava se passando, de tão confuso que ficou.

O Essencial

É difícil numa temporada com tantos episódios de destaque separar o que seria essencial e não dizer simplesmente “assista aos melhores”. Aliás, faça isso mesmo assista aos melhores, o único que eu excluiria desta lista seria o piloto original, A Jaula. Seria o caso de assistir apenas por “interesse histórico”, o capítulo é muito complicado e pouco didático e, claro, é recontado em A Coleção, inclusive com passagens explicativas – este com certeza um essencial.

Então, tiraremos do caminho todos os que já entram automaticamente numa lista como essa e citei ao começo do post: O Equilíbrio do Terror, A Semente do Espaço, Um Gosto de Armageddon, O Demônio da Escuridão e A Cidade a Beira da Eternidade. Se não for pra assistir esses daqui, melhor nem tocar nos seus VHS. Queria manter o destaque nestes que são meus favoritos, mas ainda há alguns de qualidade muito elevada, até superior que alguns destes, e você não pode deixar de ver: O Primeiro Comando contando como seria ter Spock liderando uma equipe; especialmente suas contradições, num capítulo importante demais ao personagem. E Missão de Misericórdia, que apresenta os Klingon, como perigoíssimos inimigos, ainda que muito diferentes do que passaríamos a ver posteriormente (inclusive visualmente – outro retcon fantástico de ENT, nunca vou me cansar de lembrar deles).

Em um degrau abaixo, capítulos não tão geniais mas que ainda divertem bem e apresentam importantes traços tanto de personagens quanto do seriado são Tempo de Nudez, o primeiro de uma série de autoplágios, e Corte Marcial, um courtroom drama pra lá de interessante mesmo que com furos ao final do episódio. Enquanto isso, O Senhor de Gothos ainda que não tão brilhante, têm boas sacadas – que contrariam o cânon, todavia – e criam um arquétipo de personagem que se tornará constante nos seriados.

Uma página negativa, mas importante pelo choque e até para nos lembrarmos da idade do seriado e para não endeusarmos ele tanto; é essencial ver algum mais impregnado de pensamentos da época – preconceituosos, sendo mais claro. Acredito que um em que isso fica muito claro, mas não é tão chato, seria Inimigo Interior.

JaulaExcelenteMelhores
O Sal da TerraBom
O Estranho CharlieMediano
Onde nenhum homem jamais esteveMediano
Tempo de NudezMuito BomEssencial
Inimigo InteriorRuimPiores / Essencial
As Mulheres de MuddHorrívelPiores
E as meninas, de que são feitas?Bom
MiriMediano
O Punhal ImaginárioMediano
O Ardil CarboniteMuito Bom
A Coleção, parte 1ExcelenteMelhores / Essencial
A Coleção, parte 2Muito BomMelhores / Essencial
A Consciência do ReiMuito Bom
O Equilíbrio do TerrorExcelenteMelhores / Essencial
A LicençaMuito RuimPiores
O Primeiro ComandoExcelenteEssencial
O Senhor de GothosBomEssencial
ArenaMediano
Amanhã é OntemRuimPiores
Corte MarcialMuito BomEssencial
A Hora RubraBom
Semente do EspaçoExcelenteMelhores / Essencial
Um gosto do ArmageddonMuito BomMelhores / Essencial
Deste lado do ParaísoBom
O Demônio da EscuridãoExcelenteMelhores / Essencial
Missão de MisericórdiaMuito BomEssencial
O Fator AlternativoMuito RuimPiores
A Cidade a beira da EternidadeExcelenteMelhores / Essencial
Operação: Aniquilar!Bom

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Publicado por Lucas Palma

Paulistano, desde que me lembro por gente fascinado pelas possibilidades do futuro, em games, filmes e seriados, herança paterna e materna. Para surpresa geral, ao final da juventude descobri fascínio também justamente pelo oposto, me graduando e mestrando em História, pela Universidade Federal de São Paulo. Sou autor de Palavras de Revolução e Guerra: Discursos da Imprensa Paulista em 1932.

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