É assim que se perde a guerra do tempo

É assim que se perde a guerra do tempo – Amal El-Mothar e Max Galdstone

Tradução: Natália Borges Polesso – Editora: Suma (Cia das Letras)

Ano de Lançamento: 2019 – Minha Edição: 2021 – 189 páginas


Todos os gêneros tem suas temáticas surradas; aquelas que sempre aparecem e acabam contando quase sempre a mesma história. Em filmes policiais, há sempre o trecho em que o protagonista se torna um rogue agent, ou renegado, lutando contra o próprio sistema para fazer justiça; em filmes de espiões são as locações internacionais e assim vai… na Ficção Científica não raras vezes nos deparamos com alguma viagem no tempo.

Normalmente o enredo gira em torno de alguma decisão diferente aqui ou ali que alterará a história da humanidade e precisa ser refeita. Difícil inovar, mas aqui estamos diante de uma obra que inova e muito. Uma pena que a única preocupação do livro é esta.

Em um futuro não identificado mas muito adiante, duas agências de “inteligência temporal” disputam uma feroz guerra cronológica. Enviando operativos para diversos momentos e realidades alternativas para realizar pequenas mudanças nas várias Histórias – sem sabermos exatamente o porquê, todavia.

Em um desses fronts temporais, duas combatentes de facções rivais começam a se encontrar constantemente nessas “batalhas”, uma desfazendo as alterações históricas da outra, e acabam se conhecendo e se apaixonando. Esse romance, como narrativa, se desenvolve através das correspondências que uma deixa para a outra nos meios mais curiosos possíveis.

O foco dos autores está depositado integralmente nas cartas, que são intercaladas com pequenos trechos narrativos explicando um pouco do que se passa. Mas bem pouco, na realidade, pois na maioria desses curtos “capítulos”, os escritores estão dedicando exclusivamente em como a correspondência foi escondida. O que realmente fazem muito bem, é uma forma mais curiosa que a outra e dão gás a obra. Já as cartas em si são um pouco menos inspiradas ainda que muito apaixonadas e poéticas.

Eu me surpreendi bastante quando descobri que a dupla de autores estava encarregada, cada um, de escrever as correspondências de apenas um personagem – isto é, realmente lemos a uma troca de epístolas de duas pessoas. Não é muito isso que parece.

Optando por uma temática LGBT, o romance é entre duas mulheres – bom, mais ou menos isso também porque sequer sabemos se as personagens são humanas, se têm gênero ou sexo, elas apenas e tão somente se utilizam de pronomes femininos – então o desafio dos escritores é ainda maior. Com nomes e caracterizações genéricas – literalmente, uma se chama Blue e a outra Red e não temos características físicas confiáveis pois elas podem tomar várias formas – temos um referencial a menos para identificar os autores de cada carta quando ambos utilizam os pronomes femininos. A paixão de uma pela outra também é completamente simétrica, se tornam apaixonadas perdidamente uma pela outra ao mesmo tempo.

Tudo isso para dizer que, exceto pelo remetente e destinatário fica muito difícil saber quem está falando com quem durante a leitura de cada carta. Não raras vezes é necessário voltar algumas páginas para recuperar a informação de quem está falando (ou escrevendo).

A forma e estilo de escrita não são suficientemente diferentes de uma personagem para outra. Caso uma estivesse tentando conquistar a outra, ou uma relutante e a outra disposta a mergulhar no amor, ajudara a diferenciar; todavia até na relutância ambas são idênticas. De um lado é uma carta dizendo quanto a ama e quanto isso é perigoso, e a outra respondendo que a ama ainda mais e é ainda mais perigoso, e fica nisso, nesse ciclo de declarações de amor, especialmente da metade para o final. Quando parecemos assistir uma pessoa trocando cartas consigo mesma (eu, inclusive, considerei que poderia ser esse um paradoxo temporal por trás do livro).

Claramente se divertindo muito com as cartas, os autores acabam se dedicando ainda menos com o passar do livro com as descrições e ambientações intercalando as correspondências. No começo havia uma experimentação com relação às possibilidades de alterações na história, mesmo sem muito detalhamento, criando divertidos contextos para as cartas; o que muda drasticamente ao final, quando as vezes são apenas frases amontoadas de como uma delas está se sentindo (sentimentos que se repetem logo em seguida na carta, aliás).

O livro é depositado unicamente nas inovações da sua forma, ligando muito pouco para o conteúdo (o enredo em si), apresentando explicações mínimas sobre aquele universo. O problema do ineditismo é que em algum momento você se acostuma com ele e o impacto é cada vez menor; e se não sobra mais nada para se interessar, ele perde seu valor.

Mediano (2,5/5)

preocupado mais com a forma que o conteúdo, o livro aposta totalmente em inovações: na temática, no público alvo, na narrativa. Entretanto, o fôlego do novo uma hora acaba. da metade para o final, sem alimentar muitas explicações do enredo ou universo ficcional em que tudo se passa, vira apenas uma troca de declarações de amor oca entre as duas personagens genéricas usando de linguagens idênticas.

Edição luxuosa – ou não, a editora Suma, que é um selo da Cia das Letras vem trabalhando com Ficção Científica em capa dura, o que dá um ar bastante luxuoso a obra. Melhor que a edição de “Espere Agora pelo ano passado”, completamente pelada, temos alguns elementos pós-textuais e algumas artes – ainda bastante aquém do que a Aleph, referência no gênero no Brasil, costuma oferecer. Entretanto, observando comentários em sites de compras e a minha própria experiência, não houve muito cuidado na brochura, soltaram algumas páginas da minha edição.

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Publicado por Lucas Palma

Paulistano, desde que me lembro por gente fascinado pelas possibilidades do futuro, em games, filmes e seriados, herança paterna e materna. Para surpresa geral, ao final da juventude descobri fascínio também justamente pelo oposto, me graduando e mestrando em História, pela Universidade Federal de São Paulo. Sou autor de Palavras de Revolução e Guerra: Discursos da Imprensa Paulista em 1932.

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