A Revolução Colombiana – Forrest Hylton
Tradução: Magda Lopes – Editora Unesp
Ano de Lançamento: 2007 – Minha Edição: 2010 – 191 páginas
Nestes últimos meses a política colombiana se tornou um destaque positivo, provavelmente pela primeira vez na história, ao eleger o primeiro presidente de esquerda do país; o antigo guerrilheiro do grupo M18, Gustavo Petro, chegou ao poder após uma eleição apertadíssima. O espanto foi generalizado, provavelmente pelo fato de, não apenas ter ganho a eleição em país no qual raríssimas foram as eleições livres, mas por ele ter chegado vivo até a posse.
O histórico de candidatos presidenciais assassinados Colômbia é extenso, passa da casa de dezenas. De fato, o nosso vizinho é o país mais difícil do mundo para ser um ativista; é o local em que mais militantes são mortos em todo o planeta. A tradição de violência política, é de longa data, e remonta, pelo menos, até a Guerra dos Mil Dias (1899 a 1902), entre o Governo Conservador e as Guerrilhas Liberais. Desde então, pouco, ou nenhum diálogo político colombiano conseguiu ser feito. Explicar o porquê desta característica tão particular de um país relativamente antigo e consolidado é o objetivo deste historiador estadunidense.

Hylton demonstra que, na realidade, após a morte de Simon Bolívar em 1830 e a posterior dissolução da Gran-Colombia entre Colômbia, Venezuela e Equador, o país passou a manter uma constante forma de fazer política através da violência. Muito embora, no século XIX, segundo o autor, era uma paisagem relativamente mais calma que em outros países da América Latina.
Este parágrafo está contraditório, e é um pouco o padrão do livro. Como não existe exatamente um evento histórico chamado de Revolução Colombiana, o texto é muito desorientado. Temos aqui uma breve história política da Colômbia, mas que acaba deixando a desejar especialmente na parte que cobre os primeiros cem anos do país; são muito comuns ideias que contradizem umas às outras, e a concatenação dos eventos é bastante confusa.
A partir do período chamado de La Violencia, entre 1948 e 1958, iniciados após o assassinato de Jorge Gaitán, um líder muito popular e candidato à presidência pelo partido Liberal, o autor parece ficar mais à vontade e o texto se torna mais coerente. Estes conflitos acabaram por transformar o país para sempre. Gaitán, ex-prefeito de Bogotá, ministro da Educação e do Trabalho, teria potencial para ser uma figura populista, com as devidas proporções aplicadas, como Vargas ou Perón.
Diante de sua morte, a população se levantou no Bogotazo: uma série de motins, depredações e manifestações pela capital em protesto ao assassinato. A repressão do partido Conservador, no governo, foi tão intensa quanto, e, em poucas semanas, o país explodiu em uma guerra civil difusa e descentralizada. Autoridades locais conservadoras realizavam expurgos dos adversários, guerrilhas liberais eram formadas em resposta e iniciavam combates. Diante da perseguição, mesmo políticos moderados do partido Liberal, passavam a abandonar o campo institucional – que já não era muito forte – e engrossavam as fileiras das guerrilhas. Após 10 anos de conflito, cerca de 300 mil pessoas morreram.

Atentados, sequestros, assassinatos e massacres se tornaram sinônimos de disputa política. E conforme Hylton aponta, os eventos de La Violencia, impossibilitam diálogos políticos até os dias atuais; constantemente candidatos ou representantes relembram em seus discursos a morte de pais, tios ou avôs, no período, acusando uns aos outros.
Um outro elemento surge também neste momento definidor da Colômbia: os massacres não eram, de maneira alguma, aleatórios. Muitos dos atentados perpetrados pelas autoridades no poder visavam a disputa de terras e bens no interior do país – de geografia muito complexa, cortada por cordilheiras. A constante expropriação dos camponeses gerou cerca de 2 milhões de refugiados internos, expulsos dos seus locais de origem, perdendo suas propriedades para latifundiários. Neste contexto, para assentar estes novos sem-terra e garantir a distribuição ou posse da terra, surgem as guerrilhas revolucionárias, como as FARC, o M19, e o ELN, para citar os mais importantes.
A partir daí é um nó que fica cada vez mais difícil de desatar. O autor não consegue explicar exatamente, mas se dá a introdução da produção de Cocaína nos anos 70 e ela rapidamente passa o Café, tradicional produto colombiano, como principal fonte de poder e riqueza nacional. La Violencia termina com a criação de uma Frente Nacional nos anos 60, entre políticos de ambos os partidos, garantindo uma relativa alternância de poder – pois a maioria dos liberais mais militantes ou foi morta ou saíra da política. Mas o que põe fim, segundo Hylton, no período é a Cocaína criando uma nova burguesia que destrona a cafeeira.
A guerra entre Conservadores e Liberais é substituída pela guerra entre Governo e os Grupos Guerrilheiros, com os narco produtores como fiéis da balança. Conforme as pressões internas e externas, em especial dos Estados Unidos, se desenrolavam o governo ora se aliava, oora combatia, os produtores de Cocaína. Gradualmente, também, através dos incentivos financeiros americanos, o combate pelo Estado era terceirizado através de grupos paramilitares de extrema direita (muitas vezes, eles mesmos, narcotraficantes).
Como em La Violencia, atentados, sequestros, assassinatos e massacres voltaram a ser o cotidiano do “diálogo” político colombiano poucos anos depois. O que absolutamente esvaziou a política do país. Conforme o livro, com a exceção do governo de Belisario Betancur (1982-86) e, em menor medida, Cesar Gavíria (1990-94), nada se discutia ou se trabalhava na Colômbia exceto continuar a violência política. Até mesmo a ideia de que o Estado deveria investir nas regiões controladas pelas FARC, como nos demais departamentos colombianos, para integrar as populações destes locais ao estado-nação e assim enfraquecer o poder das guerrilhas e dos paramilitares, era algo considerado extravagante demais.

Pelo contrário, com estreita cooperação do governo estadunidense, o Governo Álvaro Uribe (2002-10), momento no qual o livro foi escrito, iniciou o famigerado Plano Colômbia, com a injeção de quase 4 bilhões de dólares em programas militares que, a partir da “fumigação” sobre regiões suspeitas de receberem plantações de coca, destruiu até 10% do solo fértil da Colômbia. Como as regiões não são controladas pelo Estado, não é exatamente conhecido o impacto, ambiental, alimentar ou na saúde pública das pessoas nas regiões antigidas.
De fato, a situação na Colômbia é muito foda. E é mais ou menos essas as conclusões que podemos tirar, pois infelizmente o livro é bastante mal delimitado. Seguindo a linha editorial desta excelente coleção, a história do país é resgatada para explicar a Revolução a qual o texto se dedica, entretanto, não houve exatamente uma Revolução Colombiana como evento histórico. Não é como a Revolução Cubana ou Iraniana, ou mesmo outros episódios menos consolidados desta forma, tais como as lutas de Independência Africana, no sentido de mudança de regime político daquela nação. Talvez uma história das FARC, e territórios controlados por ela, poderia ser algo mais próximo disto, mas não sei se seria o caso, e, de toda forma, não é a opção do texto.
O que lemos, na realidade, é uma breve história política da Colômbia, ou uma história da Violência Política na Colômbia. O livro serve muito bem para compreendermos a complexidade da política em nosso vizinho e fazer um mapeamento mais panorâmico do conflito por lá, mas, especialmente, no que tange ao século XIX e primeira metade do XX, o texto é bastante confuso e difuso.
Não raras vezes, informações, eventos, siglas, nomes são injetados sem maiores explicações e você não sabe exatamente ao que se refere. Da mesma forma, não há exatamente um fio condutor no sentido, justamente, de uma transformação social colombiana. O que une cada período contado é, novamente, a brutalidade e violência das mais cotidianas disputas políticas – o que, por sua vez, de fato é a principal característica da história da Colômbia.
Bom (3/5)
É um grande esforço de dar sentido a uma história política extremamente complexa como a colombiana, entretanto, o texto é mal delimitado. Justamente pelo fato de não ter existido uma “revolução colombiana”, não há exatamente um fio condutor senão ser uma “breve história da violência política na colômbia”.
Uma eterna República Velha – até a introdução da produção de cocaína, entre os anos 70 e 80, a economia colombiana girou em torno das plantações de Café situadas no centro-norte do país; não por acaso, as regiões mais populosas do país, como Antióquia, Cundinamarca e o Vale do Cauca. Sem diversificar muito a base econômica, a burguesia permaneceu relativamente homogênea e os embates eram entre os partidos Liberais e Conservadores em torno de pautas modernizantes – lembrando até mesmo um cenário do Brasil Império.
Numa espécie de eterna República Velha, mas apenas de Café com Café, não houve crescimento partidário e disputa política na esfera pública-institucional. A tradução desses embates em conflitos armados pode ser um dos resultados da completa inviabilidade de vários grupos de participar da política. O que foi apenas agravado após as guerras civis, o Partido Liberal, que abarcava várias correntes de oposição, teve suas alas esquerdas completamente aniquiladas após La Violencia e o jogo político ficou ainda mais restrito.

Sem populismo – uma consequência desta eterna república oligárquica foi que não houve na Colômbia um movimento populista, como o Varguismo ou o Peronismo. Longe de carregar o sentido pejorativo que é atribuído ao termo, o populismo na América Latina foi muito importante para interromper a política elitizada típica da virada do século passado – os candidatos passaram a direcionar suas políticas à população, de forma a integrá-las às disputas públicas, ainda que forma paternalista ou autoritária.
O mais próximo que os colombianos estiveram disso foi com Jorge Eliécer Gaitán, nos anos 40. Muito mais ousado, e mais identificado com a esquerda que suas contrapartes citadas acima, ele foi candidato às eleições presidenciais em 1945 e 1949 pelo partido Liberal. Seu assassinato, em 1948 jogou o país na sua mais violenta guerra civil, ainda que não tenha tomado forma como conflito armado, La Violencia.
O resultado foi uma vitória esmagadora dos Conservadores, que esvaziaram o partido liberal de seu conteúdo progressista (através do assassinato das lideranças desse caráter) e empurraram os sobreviventes para a ilegalidade das guerrilhas, derrotadas neste século. É uma trajetória comparativa interessante para à crítica dos populismos pela esquerda.
Narcos – Dizer que Pablo Escobar foi uma figura controvérsia é um pleonasmo, e ele é um personagem importante também neste livro, em conjunto com os demais traficantes do período. Entretanto, diferentemente de seu retrato no famoso seriado, e em várias outras mídias, Hylton argumenta que ele – nem outros narcos – não era tão alheio à política institucional assim. Quando Escobar chegou ao parlamento, por exemplo, foi através da suplência de um antigo deputado, Ortega Ramirez; que, por sua vez, era do grupo de Alberto Santofimio e do ex-presidente Alfonso Michelsen.
Indesejáveis – Durante o crescimento do combate às guerrilhas através dos grupos paramilitares, nos anos 1980, elas, em conjunto com autoridades e mesmo traficantes, organizavam “operações de limpeza social” nas principais cidades colombianas atrás de subversivos. Tornou-se desculpa para um extermínio de vários grupos, como deficientes físicos e mentais, moradores de rua, prostitutas, homossexuais, traficantes independentes e dependentes químicos, chamados de indesejáveis. O nível da violência urbana era de tal magnitude que esses assassinatos passavam “desapercebidos” pela polícia (que fazia parte dos esquadrões de extermínio), imprensa e sociedade civil.
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