O Imperador: a queda de um autocrata – Ryszard Kapuscinsky
Tradução: Tomasz Barcisnki – Companhia das Letras
Ano de Lançamento: 1978 – Minha Edição: 2005 – 192 páginas
Poucos dos atuais países no mundo podem ter o “privilégio” de reclamar sua origem a tempos tão remotos, de forma contínua, como a Etiópia. Pelo menos desde o século I AC o Império de Axum se estabeleceu na região e conviveu com o Império Romano, Bizantino, Árabe… como também o Britânico, Francês e Italiano. Se converteu ao cristianismo e é até citado como o local de esconderijo da Arca da Aliança e do Santo Graal.
Mas por que parar por aí? A monarquia Etíope se considerava composta por descendentes diretos do Rei Salomão, sim, aquele; criando uma história de três mil anos de reino ininterrupto. Para além da megalomania e dos mitos de fundação, os monarcas etíopes tem certa propriedade em alegar sua longevidade, afinal, de fato, aquela nação, ainda que não exatamente a mesma ao longo desses milênios, se manteve existente e independente.

O últimos desses monarcas salomônicos foi contemporâneo a muitos dos eventos do século XX, mas ao mesmo tempo, parecia ainda perdido nos tempos bíblicos; Hailé Selassié, que foi o Imperador entre 1930 e 1974 – e já regente desde 1916, numa amostra de sua habilidade política, enquanto governava a imperatriz, tia de sua esposa.
Um grandioso estadista, excelente diplomata e símbolo da resistência africana perante ao imperialismo europeu, foi um dos principais articuladores da Organização da Unidade Africana (que é sediada até hoje, com outro nome, em Addis Abeba), e também reconhecido como um modernizador internacionalmente. Mas dentro das fronteiras da Etiópia e, especialmente, dentro de seu palácio, lembrava um pouco menos a modernidade.
Neste livro, composto apenas por depoimentos, e algumas intervenções muito pontuais do jornalista polonês, ele resgata histórias de pessoas que trabalhavam no Palácio imperial, normalmente servos de diversos escalões. Divididos pelo autor em três períodos de tempo: referentes ao auge do regime, antes de uma tentativa de golpe sofrida em 1960; sobre a lida com a oposição crescente naquela década, e um grupo final com relatos de episódios imediatamente antes da revolução de 1974.

São descritos episódios extremamente cotidianos, como o do cortesão cujo papel era colocar sempre uma almofada sob os pés de Selassié para que ele não parecesse baixinho no trono; a até observações políticas sobre as diferentes facções que apareceram durante as décadas de crise. Mas tudo, ao final, passa a impressão de um governo perdido no tempo.
Os rituais e práticas da corte não deviam nada às clássicas estórias de príncipes e princesas ou reis e rainhas. Toda a burocracia estatal dependia da distribuição de favores e nomeações vindas do imperador, que tinha seu ministro da Pena, responsável por colocá-las no papel. Nessas audiências, os aristocratas (chamados de “dignatários” pelos depoimentos) de toda parte do país recebiam autorização para explorar uma determinada terra, fundar uma empresa, controlar comércios ou logística de mercadorias.
Sendo assim, o funcionamento do governo dependia das diversas “horas”: a hora das nomeações, a hora da indústria, hora do comércio, hora da inteligência, dentre outras nas quais ele recebia informações de seus ministros e conselheiros e eventualmente tomava alguma decisão. Todos estes escolhidos dentre pessoas pouco capazes. Desta forma, nenhum membro do governo teria força ou inteligência para realizar alguma reforma ou política mais drástica, o que poderia fazer com que o imperador perdesse a dianteira de todos os processos do país.
Ainda, como em suas viagens diplomáticas, que eram muitas, Selassié sempre buscava as piores companhias possíveis para a delegação: os opositores mais ameaçadores naquele momento, de modo a impedir eventuais conspirações enquanto estivesse fora.
Sua lida com a oposição era também muito peculiar: para além do autoritarismo do regime, o Imperador sempre patrocinava grupos mais fracos nas diversas disputas, distribuindo a eles nomeações e favores, até se fortalecerem. Em seguida passar essa ajuda para outro, que combateria o anterior, e assim seguir o ciclo.

Todas essas situações e estratégias são narradas com muita reverência pelos antigos serviçais, todos os depoimentos o cobrem de elogios e adjetivos honoríficos… e é claro que a impressão ao fundo é de uma fina ironia perpassando todo o o livro. Porque, ao final, o que cada registro cria é a sensação de uma indignação crescente pelo governo, que estoura na Revolução de 1974. Aqui ela, e suas graves contradições, não são cobertas, pois o ponto de vista da obra é, como o título denuncia, o dia a dia do imperador em seu palácio até aquele ponto.
Excelente (5/5)
Uma obra única: composto por dezenas de depoimentos de antigos funcionários do palácio imperiaL, é um mergulho em histórias perdidas e obscuras, uma viagem a um mundo que não existe mais. O valor do registro é inestimável e a leitura muito agradável, embora não muito didática pois o autor praticamente não interfere no texto.
Derg: O esquecido feudalismo etíope foi substituído por um também obscuro socialismo etíope. Da mesma forma que Hailé Selassié despertava simpatia pela resistência ao imperialismo europeu, mas se tornou controverso no governo posterior, o Derg – “Comitê”, em amárico, era um grupo de militares – também foi saudado pela libertação das amarras milenares daquele sistema, mas em pouco tempo se mostrou incapaz de lidar com muitos dos problemas do país, especialmente a fome. Empregou uma violenta repressão e sofreu com uma violenta oposição.
A história está resumidamente contada neste outro livro:
As Revoluções Africanas
Um excelente e didático resumo de três das mais violentas guerras civis e mais complexas revoluções do século XX.
Viagem ao Brasil: O ano de 1960 foi mais um momento de relevante projeção internacional: Selassie colocou a Etiópia entre os países que participavam de missões de paz da ONU. E para coroar os sucessos diplomáticos daquele período, o imperador fez uma última viagem internacional ao longínquo Brasil, em dezembro. Recebido pelo presidente Juscelino Kubistchek no Rio, e depois conhecendo a nova capital, a viagem foi um sucesso. Selassié ficou maravilhado com a idéia de construir uma nova sede de governo.
Enquanto isso, no palácio em Addis Abeba as coisas estavam agitadas. Uma parcela expressiva da guarda imperial tentou realizar uma rebelião; ela depôs o que restava do governo em casa e proclamou o filho de Hailé, o príncipe Asfaw Wossen, como novo monarca. Ele interrompeu a visita em Brasília e iniciou a viagem de volta para a Etiópia.
A revolta controlou a capital por poucos dias e logo foi suprimida por forças leais ao imperador, antes mesmo dele concluir o retorno. Apesar da curta duração, e do final efetivo do governo ter se dado apenas em 1974, a rebelião foi um ponto sem volta. Mesmo com as estratégias de Selassié em suas viagens, de escolher a dedo os líderes de oposição para acompanhá-lo, naquela vez, não foi possível reunir seus principais inimigos para curtir a praia de Copacabana. A insatisfação com o regime havia fugido do controle direto do governante.

Controvérsias: No posfácio da obra, de Mario Sérgio Conti, são levantadas algumas contradições dos depoimentos resgatados por Kapuscinski e registros oficiais, como os hábitos de leitura do imperador. Entretanto, como a obra deixa clara, quem fala são os antigos serviçais do palácio, não o jornalista ou acadêmicos.
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